Vida Nômade: Privilégio, Exílio ou Sobrevivência? Os Prós e Contras de Morar na Estrada


Dizem que viajar é a única coisa que você compra e que te deixa mais rico. Talvez. Mas ninguém fala da bagagem emocional que você carrega de volta — e, pior, da que você deixa para trás.

Falo isso como alguém que viveu anos na estrada, não como turista, mas como imigrante errante. Alguém que se despediu tantas vezes que a despedida virou rotina. Que já teve casa em sete países e não se sente em casa em nenhum.

No vídeo de ontem, o Nômade Raiz mostrou um lado da Venezuela que desafia estereótipos. E a brasileira na Alemanha revelou, com um depoimento cru, que nem mesmo o passaporte europeu garante pertencimento. Há algo de profundamente verdadeiro nisso: cruzar fronteiras geográficas raramente resolve os vazios simbólicos.

A vida nômade, por fora, parece liberdade. Por dentro, é fissura.


O fascínio da partida

Começa com o encantamento. O impulso de largar tudo e ir. A primeira noite em uma cidade desconhecida tem cheiro de começo de mundo. É quando tudo é possível: o novo idioma, os mapas tortos, os supermercados estranhos, as ruas que não dizem nada — ainda. Você é estrangeiro, mas, por um breve instante, ser estrangeiro é ser ninguém, e ser ninguém é poder ser qualquer um.

O fascínio é real. E necessário. Ninguém começa uma jornada dessas porque está bem. A gente vai porque algo dentro já partiu. E a estrada oferece a ilusão de que, andando o bastante, talvez nos encontremos.

Mas toda viagem tem prazo de validade. E depois do fascínio vem o cansaço.


A solidão e o exílio interior

O que poucos contam é que morar fora, mudar de país, viver na estrada com família, filhos e cachorro, é muito diferente de postar fotos de paisagens no Instagram.

Ser nômade, quando não é luxo, é renúncia. É trocar estabilidade por impermanência, rede de apoio por improviso, vínculo por despedida.

Você troca de país, mas os dilemas te acompanham. A falta de dinheiro, a solidão, a sensação de estar sempre começando do zero. Você não pertence. Não é daqui. Nunca será. E ainda assim precisa pagar aluguel, lidar com a burocracia, com as olhadas tortas, com o sotaque que te denuncia, com o cansaço.

E tem o filho. Que nasceu em um lugar, cresceu em outro, fala um idioma que você não domina, e um dia te pergunta: “De onde eu sou?”

Boa pergunta, filho.


Entre fronteiras simbólicas

Há uma ideia de que ser cidadão do mundo é um privilégio. E, de fato, é — mas nem sempre pelos motivos que se imagina. Não se trata de acúmulo de carimbos no passaporte. É algo mais amargo: um certo desapego forçado. Um desraizamento.

Você se acostuma a não se apegar. Aprende a viver com pouco. A vida vai cabendo em menos malas. Até que você sonha em viver com uma mochila só. Não por estilo, mas por exaustão.

E o que começa como desejo de liberdade, muitas vezes vira necessidade de pertencimento.

Como escrevi em Fragmentos Nômades, não se trata apenas de cruzar fronteiras físicas. Trata-se de cruzar limites de identidade. Você deixa de ser quem era e ainda não sabe quem vai ser.


Vale a pena?

Às vezes, sim. Às vezes, não.

Conheci gente que me acolheu com um abraço que parecia dizer: “fica”. Conheci vizinhos que viraram família. Conheci lugares onde me senti visto, onde a minha existência parecia importar. Também conheci a xenofobia, o desprezo, a hostilidade camuflada — ou não.

Já quis voltar. Já jurei que nunca mais. Já tive certeza de que havia encontrado “meu lugar” — e, meses depois, quis partir de novo.

Porque a vida nômade, quando não é fuga, pode ser busca. Mas é preciso saber o que se está procurando. E estar disposto a talvez não encontrar.


O que fica

No fim das contas, o que fica são os fragmentos. Histórias costuradas com cansaço e encantamento. Rostos que não se esquecem. Lugares que ainda ecoam. E a consciência de que talvez não exista “lar” — só lugares onde, por algum tempo, conseguimos respirar.

E isso, por si só, já é muito.


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